{encontros clandestinos}


foi naquela tarde morna
que recebi a graça de mirar teus olhos de baobá.
a princípio fiquei paralisada, estática
você olhava pro céu

sentia apenas o toque do tambor ancestral
pulsar por cada fibra
transe em forma de raiz
e por um instante
revivi todas as minhas vidas passadas
e nos teus olhos baobá vi todas as tuas.

saí do meu corpo: eu já não era eu,
mas senão um buquê de espíritos e estradas
estradas de mulheres e homens
que perambulando descalços
por centenas de milhares de estrelas
contam histórias de caçadas e plantios
habitamos naquele instante
um mistério profundo -
revelado por canto grave de mulher velha
algo sobre a cor amarela do fim de tarde
que ao enternecer nossa testa e nossos lábios
traz a benção dos antepassados.

admito que poderia ouvir teus contos por algumas vidas
sentados, eu e ti, sob a sombra de um baobá
aquele dos teus olhos.
percorreríamos a trilha da sabedoria de mil flores azuis
como nosso único e mais pleno destino.

contudo, olho pra ti prisioneiro nesta terra distante
e por um instante
habito contigo teu mundo ancião
eu de cá e você do outro lado da margem
rio intransponível por embalar mil almas num fluxo cármico

~compro e vendo ouro~

-moça, me vê um cigarro?

desperto do feitiço dos olhos baobá
aperto o passo,
corro pelo calçadão da república,
tô atrasada pro trampo!

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